
quarta-feira, 28 de julho de 2010
As livrarias mais charmosas de Buenos Aires

quinta-feira, 15 de julho de 2010
Argentina dá exemplo com o casamento gay

Não adiantou o Monsenhor Bergoglio ter dito que "o demônio" estava por trás dessa iniciativa. O Senado argentino a aprovou por 33 votos a favor, 27 contra e 3 abstenções. Assim, a Argentina se tornou o primeiro país da América Latina a legalizar a boda de homossexuais. Eu me sinto orgulhoso: finalmente uma boa notícia daqui dos pampas.
Ontem, vendo o debate dos senadores madrugada afora, vi que a desinformação a respeito do assunto é grande mesmo entre os ilustres parlamentares. Muitos usam a expressão "escolha sexual", como se o sujeito "decidisse" ser gay às 4 da tarde de uma terça-feira. Hoje há evidências suficientes para afirmar que a orientação sexual tem um componente biológico. Tanto que a proporção de gays gira em torno de 2% a 5% no mundo todo, sem importar a cultura, a religião ou a opressão de países como o Irã e a Arábia Saudita.
Bergoglio e companhia também acreditam que é possível “curar” gays. Mas ser gay não é doença, meu caro Monsenhor. É uma variação absolutamente natural do comportamento humano - e animal, diga-se.
Muitos opositores da lei aqui na Argentina têm medo de que filhos adotados por casais gays serão gays também. Minha gente, ser gay não é contagioso. Garanto que os gays que vocês conhecem são filhos de casais heteros. Além disso, o número de gays não é maior entre filhos criados por casais de homossexuais.
Abaixo eu listo algumas descobertas recentes sobre as origens da homossexualidade. Sei que muita gente vai ler tudo e concluir: “Ok, mas não acho que seja assim” (nossas opiniões sobre alguns assuntos são mesmo sedimentadas, não?). Mas se alguém estiver disposto a sair das trevas do Monsenhor Bergoglio, eu recomendo ler também uma matéria que fiz em 2006 e o livro “Born Gay”, de Qazi Rahman.
A resposta biológica
Em 1991, o neurocientista anglo-americano Simon LeVay, gay declarado, anunciou ter encontrado diferenças em cérebros de homens gays e héteros. LeVay examinou o hipotálamo, zona-chave da sexualidade no cérebro, e descobriu que a região chamada INAH-3 era entre 2 e 3 vezes menor nos gays. "Minhas pesquisas sugerem que algo acontece muito cedo na vida dessas pessoas, provavelmente na vida pré-natal", diz ele.
A pista genética
Veio em 1993 com Dean Hamer, do Instituto Nacional do Câncer, nos EUA. Hamer percebeu que dentro das famílias havia muito mais gays do lado materno. A descoberta atraiu sua atenção para o cromossomo X (mulheres têm dois cromossomos X, enquanto os homens têm um X e um Y). Em seguida, a descoberta: usando um escâner, Hamer viu que uma região do cromossomo X, a Xq28, era idêntica em muitos irmãos gays. O que ele descobriu não foi propriamente um único gene gay, mas uma tira de DNA transmitida por inteiro. A notícia provocou rebuliço, e não era para menos. Mesmo contestada por outros estudos, a conexão entre genes e orientação sexual sugere que as pessoas não escolhem ser homossexuais, mas nascem assim.
Pesquisas com gêmeos
Os pesquisadores americanos Michael Bailey, da Universidade Northwestern, e Richard Pillard, da Universidade de Boston, analisaram gêmeos e viram que, entre bivitelinos, se um deles é gay, o outro tem 22% de possibilidade de também ser. Para os univitelinos, a probabilidade sobe para 52%.
São números bastante superiores à taxa de homossexualidade entre a população (entre 2% e 5%). Bailey e Pillard, portanto, praticamente provam a existência de um componente genético para a homossexualidade. Ao mesmo tempo, praticamente provam, também, que os genes não dão conta de tudo. "Os estudos com gêmeos feitos até agora nos permitem uma estimativa de que até 40% da orientação sexual venha dos genes", diz o pesquisador Alan Sanders, da Universidade Northwestern, EUA.
Hormônios sexuais durante a gravidez
Se os genes não explicam tudo, que outros elementos explicariam? Um deles parece ser o desenvolvimento biológico do feto ainda no útero. E é dessa área que vêm saindo as pesquisas mais promissoras. Uma delas é a teoria dos hormônios pré-natais. A idéia é que os hormônios sexuais masculinos (andrógenos) se conectam às partes responsáveis pelos desejos sexuais no cérebro e influenciam seu crescimento, tornando o cérebro mais tipicamente masculino ou feminino. A conexão dependeria das proteínas receptoras de andrógenos (AR, na sigla em inglês).
Imagine que cada célula do cérebro seja uma casa. As ARs funcionariam como o portão dessas casas, que controla a entrada de pessoas. Sabe-se que a quantidade e a localização desses portões são diferente nos homens e nas mulheres. Cientistas já constataram, por exemplo, que o hipotálamo masculino tem mais ARs que o feminino. Essa teoria supõe que a homossexualidade nos homens é causada por "portões" que restringem a entrada de andrógenos nas regiões responsáveis pela sexualidade, formando um cérebro submasculinizado. Nas mulheres, esses portões facilitariam entradas maiores, construindo uma estrutura supermasculinizada. Tudo conseqüência do número de ARs de cada feto - o que talvez se deva à carga genética.
Vale lembrar que os hormônios importantes não são os que circulam no nosso sangue quando adultos - cujos níveis são iguais em homossexuais e héteros - mas os que atuaram no período de gestação.
O efeito dos irmãos mais velhos
O novo desafio dos pesquisadores é entender quais as origens de um fenômeno recém-descoberto: a existência de irmãos mais velhos parece afetar a sexualidade dos mais novos. É o chamado "efeito big brother". O cientista canadense Ray Blanchard acompanhou 7 mil pessoas e viu que a maioria dos gays nasce depois de irmãos homens e heterossexuais. Blanchard e o colega Anthony Bogaert calcularam que cada irmão mais velho aumenta em 33% a possibilidade de o menor ser gay. Um garoto com 3 irmãos mais velhos tem o dobro de possibilidade de ser gay que outro sem irmão mais velho. Um garoto com 4 irmãos mais velhos tem o triplo. Ter irmãs mais velhas não altera a probabilidade de o menino ser gay.
Para alguns, a explicação está na convivência familiar: depois de dar à luz vários homens, a mãe trataria o caçula como a menina que ela não teve. Os irmãos mais velhos também tenderiam a "dominar" o mais novo, influindo em seus sentimentos sobre si e os demais. Outra hipótese vem da biologia. "Os fetos masculinos talvez acionem uma reação imunológica na mãe ao produzirem substâncias que ameaçam seu equilíbrio hormonal", diz o cientista Qazi Rahman, da Universidade de East London. Segundo ele, o corpo da mãe acionaria um alarme para produção de anticorpos contra proteínas ou hormônios do bebê. Cada novo feto masculino intensifica a resposta, e o acúmulo de anticorpos redirecionaria a diferenciação tipicamente masculina para uma mais feminina, gerando orientação homossexual nos filhos seguintes.
A influência do ambiente
Como os outros pesquisadores, Rahman não nega que fatores ambientais possam entrar na equação. O problema é que ninguém sabe exatamente quais são eles. Não há provas, por exemplo, de que o abuso sexual na infância causa homossexualidade. O número de gays não é maior em lares chefiados por mulheres nem entre filhos criados por casais gays. Tampouco há mais casos de homossexualidade após períodos de guerra, quando os pais se ausentam de casa, o que enfraquece as hipóteses sobre dinâmicas familiares.
Sigmund Freud dizia que mães superprotetoras e pais ausentes poderiam levar o filho a ser gay. Mas Rahman tem uma opinião distinta: ao invés de encontrar a causa, Freud possivelmente enxergou a conseqüência. A superproteção da mãe não seria a origem da homossexualidade, mas um ato de defesa para um filho que é rejeitado pelo pai por se comportar, desde cedo, de maneira feminina.
Fatores biológicos + psicológicos + sociais
Embora a ciência esteja caminhando para a noção de que a homossexualidade é inata, a biologia não é completamente determinante. "Essa predisposição para a homossexualidade vai se manifestar ou não dependendo das experiências de vida da pessoa", diz a psiquiatra Carmita Abdo. Tudo indica que a homossexualidade é mesmo o resultado da interação de 3 fatores: biológicos, psicológicos e sociais, mesmo que esses dois últimos ainda precisem de mais evidências.
terça-feira, 13 de julho de 2010
Por que sonhamos?

Em 1900, o austríaco Sigmund Freud causou uma revolução no estudo da mente ao publicar A Interpretação dos Sonhos. Nele, o pai da psicanálise contestava a noção bíblica de que os sonhos eram fenômenos sobrenaturais, dizendo que derivavam da psique humana. Decifrá-los, portanto, seria a chave para entender o que se passa dentro da nossa cachola. Essas teorias foram ridicularizadas por muito tempo e somente agora, mais de 100 anos depois, elas estão sendo testadas.
Agora, a explicação de Allan Hobson (na foto abaixo, publicada na Super na edição de dez/2009). E, de quebra: por que não conseguimos lembrar dos sonhos...
Exercícios para o cérebro
Você não precisa se descabelar para interpretar seus sonhos, nem sofrer se não consegue se lembrar deles. Segundo o psiquiatra americano Allan Hobson, da Universidade de Harvard, a principal função dos sonhos é fisiológica: eles são exercícios para o cérebro. Agem como programas que rodam em nossa cachola para mantê-la atualizada, e assim nos preparam para despertar. Surpresa: não tem nada de inconsciente nisso.
Porque o cérebro é ativado enquanto dormimos. Até o século 20, pensava-se que o cérebro desligava durante o sono. Hoje sabemos que ele nunca desliga totalmente e que se ativa de novo durante a fase REM [Movimento Rápido dos Olhos, quando acontecem os sonhos mais intensos]. Essa ativação é interna: como praticamente não entram estímulos do ambiente, o cérebro faz tudo por si só. As imagens dentro dele são tão vívidas que ele pensa que está acordado. E só porque temos dificuldade de nos lembrar delas é que achamos que sonhar é um estado inconsciente – como dizia Freud.
De forma alguma. É um processo mental consciente, que ocorre durante o sono, e que simplesmente não é lembrado. Sonhar é hiperconsciente: os surrealistas diziam que seus sonhos eram mais intensos do que estar acordado.
Por que é tão difícil lembrar dos sonhos?
Porque a química do processo de ativação cerebral também muda durante o sono. Durante a vigília, são secretados altos níveis de substâncias chamadas neuromoduladores [que influenciam as conexões do sistema nervoso]. Porém, quando o cérebro se ativa no sono REM, três delas são “desligadas”: serotonina, norepinefrina e histamina. E como nossa memória é altamente dependente delas, a maior parte dos sonhos não é registrada. Para se lembrar, você precisa acordar e “ligar” essas substâncias de novo.
Quer dizer que o sonho é um estado de consciência paralelo?
Exato. Eu faço a distinção entre a consciência do sonho (primária) e a consciência na vigília (secundária). Quando despertos, nós somos conscientes do mundo exterior e de nos mesmos. Temos memória, organizamos pensamentos e controlamos percepções e emoções. Ao sonhar também somos conscientes: temos percepções e emoções, embora não reconhecemos que tudo não passa de um simulacro, às vezes bem bizarro. O importante é que a consciência do sonho nos prepara para a consciência na vigília.
De que forma?
Os sonhos reprogramam o cérebro e atualizam nossa capacidade de nos mover, pensar, sentir. São como exercícios do cérebro, que você pratica pelo menos 1 hora e meia por noite. Eles ligam atividades sensoriais e emoções, antecipando a vigília. Apenas a memória não é ligada.
Então não importa se a pessoa não se lembra do sonho?
Do ponto de vista psicológico, lembrar do sonho pode até ajudar você a entender algo. Mas do ponto de vista do cérebro, não é importante. Conheço muita gente competente que nunca se lembrou de nenhum sonho. É como numa caminhada: você não se lembra de cada passo que deu, mas o corpo sabe que se exercitou.
Sem dúvida as experiências têm algo a ver com o sonho. Mas você se conhece e sabe que isso não é tudo, certo? Há sonhos de todo tipo: felizes, tristes, ansiosos, sexuais... E até onde sabemos, só uma pequena parte é determinada pela experiência. Muitos são determinados por seu cérebro. Ele não sabe se você será atacado ou seduzido amanhã, por exemplo, e por isso precisa se preparar para tudo. Então, ele roda todos os programas quando você dorme. Mesmo numa guerra, a pessoa ainda pode sonhar com coisas que aconteceram 20 anos antes ou que nunca aconteceram. Portanto, não é que as experiências sejam irrelevantes, e sim que muitas delas são antecipadas e guiadas enquanto dormimos.
O sono REM ocorre já no último trimestre da gravidez. Ou seja: antes mesmo de você nascer, seu cérebro é ativado e um tipo consciência primária acontece. E o objetivo desse estado de consciência primordial, que foi esquecido, é ativar o cérebro de uma forma muito parecida como será ativado na vigília. No primeiro ano de vida, você passa várias horas por dia com essa ativação cerebral. Ela organiza seus neurônios, estabelece as conexões, enfim, faz todo o necessário para que você possa ir à escola depois.
Estou andando de bicicleta em Londres e tenho na garupa uma tesoura de poda de árvore. O que estou fazendo ali? Por que isso está acontecendo? Será que devo fazer uma interpretação simbólica desse sonho? Ou pensar: eu não ando mais de bicicleta, mas meu cérebro ainda sabe fazer isso. Meu cérebro supõe que seja em Londres – olhando para os ônibus de 2 andares – e tudo isso é parte de minha consciência antecipatória. Por que levo uma podadeira? Freud diria que tem a ver com castração ou ansiedade. Mas provavelmente a podadeira é uma lembrança que está no meu cérebro e que emerge numa combinação aleatória por motivos que não entendemos completamente.
Não digo isso. Digo que agora conhecemos a base fisiológica dos sonhos, o que não significa que eles não tenham significado psicológico. É tentador para muitos jornalistas escrever que minha teoria é anti-freudiana. Mas o ponto é: muito do que sabemos agora sobre o funcionamento do cérebro Freud não tinha como saber em sua época, apesar de ter sido brilhante. Assim, muitas hipóteses psicológicas sobre os sonhos são restringidas pelo que sabemos hoje.