sexta-feira, 4 de junho de 2010

Por favor, criem o estado palestino!

Ele não é apenas uma reivindicação legítima de seu povo. É também uma ideia poderosa.

Que seja em Gaza e na Cisjordânia, que seja nas fronteiras prévias a 1967 ou seja lá que forma ele tome. Mas que seja um ESTADO com todas as letras: com plenos direitos para seus cidadãos e, de uma vez por todas, com plenas obrigações aos seus governantes.

Para criar um estado, é preciso deixar de lado os gritos de guerra e arregaçar as mangas. É preciso proteger os habitantes, garantir serviços básicos, controlar as fronteiras e reconhecer o direito do país vizinho de existir. Ao contrário das revoluções e dos atos heróicos, a construção do estado é silenciosa. Não gera mártires nem manchetes apaixonadas na imprensa.

Faz décadas que ouvimos a mesma desculpa: os palestinos vivem na pobreza, em condições precárias... e tudo por causa de Israel. Como é que vão construir um estado? O que ninguém diz é que os palestinos já receberam mais ajuda per capita do que os europeus com o Plano Marshall. Que o líder palestino Yasser Arafat figurava na lista dos milionários da revista Forbes, enquanto sua gente vivia em campos de refugiados. E que o estado palestino poderia ter sido criado bem antes da ocupação israelense, em 1967, e também depois do que resta dela – como explico abaixo.

Oportunidades perdidas

Nas idas e vindas do conflito do Oriente Médio, o estado palestino teve pelo menos 3 chances de ouro pra sair do papel. Quando o mundo inteiro esperava que a coisa ia deslanchar, vinha a decepção – e uma nova onda de violência.

Tem sido assim desde os anos 30, quando a Palestina ainda era um protetorado britânico. Em 1937, ante os crescentes confrontos entre árabes e judeus, uma delegação inglesa (a Comissão Peel) recomendou a divisão daquela terra em 2 estados: um árabe e um judeu. Um enclave internacional uniria os lugares sagrados de Belém e Jerusalém ao Mediterrâneo (veja o Mapa 1). Os árabes boicotaram o plano, que foi por água abaixo.

Em 1947, veio nova chance: a Assembléia Geral da ONU votou pela partilha da Palestina em 2 estados (veja o Mapa 2). Os judeus aceitaram e declararam a independência de Israel, mas os palestinos recusaram. Gaza e Cisjordânia – que correspondiam em boa parte ao futuro estado palestino votado pela ONU – ficaram sob o controle do Egito e da Jordânia até serem ocupadas por Israel, na guerra de 1967. Ou seja: durante quase 20 anos, Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental estiveram inteirinhas em mãos árabes, mas o estado palestino não foi criado.

A terceira oportunidade chegou em 2000, quando o presidente americano Bill Clinton promoveu uma cúpula entre Arafat e o então premiê israelense Ehud Barak em Camp David, nos EUA (veja o Mapa 3). O resultado? Água de novo.

Por que não foi criado?

Pra muita gente, tanta decepção é fruto da “aliança incondicional” entre Israel e EUA. Ou é culpa do governo “ultra-direitista” de Benjamin Netanyahu. Outros acusam os “malvados soldados israelenses”. E há que desconfie que é tudo obra de uma “conspiraçãojudaico-capitalista global” ou coisa parecida.

Deixando as fábulas de lado, é verdade que Netanyahu parece não ter nenhum interesse no estado palestino. Mas é também verdade que ele só ganhou as eleições porque 10 anos atrás, em Camp David, a esquerda israelense apostou todas as fichas no acordo com os vizinhos. Não era a solução ideal para nenhum lado, mas era a chance que ambos tinham de ver o processo de paz virar realidade. Barak ofereceu dividir Jerusalém, algo impensável para a atual coalizão no governo. Mas Arafat rejeitou a proposta, do mesmo jeito que os palestinos rejeitaram o plano da Comissão Peel e a Partilha da ONU.

Com o fracasso de Camp David, a esquerda israelense saiu desmoralizada e a direita voltou ao poder. O que fez Arafat? Estimulou a 2a Intifada... e o estado palestino continuou no papel.

É fácil entender por quê. O estado palestino não é apenas uma reivindicação legítima de seu povo. É também uma ideia poderosa. Uma utopia. Uma arma retórica indispensável para líderes políticos. Nas ditaduras da Liga Árabe, as queixas contra Israel são as únicas que podem ser expressas livremente nas ruas. Seus governantes precisam deixar o “estado palestino” no plano das ideias para manter a popularidade, mobilizar multidões e canalizar ressentimentos. Do contrário, serão eles o alvo da ira.

Até mesmo Bin Laden fala em nome dessa ideia, embora nada tenha feito para viabilizá-la na prática. Faz sentido: enquanto o estado palestino for apenas um grito de guerra, ele tem mais um motivo para atrair adeptos à sua causa.

As vantagens de não ser estado

Hoje, quem acusa cegamente Israel se esquece de que em 2005 o país pôs fim à ocupação a Gaza. Inclusive retirou colonos judeus à força de lá. Olha aí outra oportunidade! Me diz: você acha que o Hamas aproveitou pra construir um estado? Não! Ele eliminou os palestinos “traidores” do rival Fatah, instaurou uma teocracia em Gaza e começou a jogar mísseis na cabeça dos israelenses. Para quem deseja ser um estado, foi uma bela demonstração de coexistência, não?

Esse é o ponto: o Hamas fala em nome de um estado, mas se fortalece justamente na ausência da estrutura estatal. Tem sido assim desde 1987, quando foi criado. E ainda pode alegar que os abusos que comete contra seus cidadãos e os do país vizinho são todos realizados por milícias, militantes, forças paramilitares – e, claro, Israel. É uma bela ironia: os direitos humanos, que desde a 2a Guerra Mundial têm sido uma arma de proteção fundamental dos indivíduos contra os abusos do estado, se transformam numa faca de 2 gumes no conflito palestino-israelense. Por quê? Porque o estado palestino não existe.

Como Gaza não é um estado, o fundamentalismo islâmico se entrincheira atrás de civis para atacar o único estado criado nesse conflito, deixando-o como o violador de direitos humanos dos palestinos. Quem sai na rua para protestar contra a violência interna e a falta de liberdade imposta pelo Hamas? Quem sai na rua para protestar contra a corrupção da Autoridade Palestina na Cisjordânia? Por que olhar para os problemas internos se é mais fácil acusar Israel como o único responsável de todos os males? Os lideres sabem muito bem disso. Jogar com as regras do jogo de um eterno não-estado é fácil: você tem todas as reivindicações e nenhum dever.

É isso aí: se você é um não-estado, pode capitalizar em cima do sofrimento de seus não-cidadãos. O Hamas declarou que não deixaria entrar suprimentos da flotilha “humanitária” em Gaza enquanto Israel não libertasse até o último detido. Ou seja: os suprimentos destinados ao povo podem apodrecer, não importa. O que importa é acabar com a imagem do inimigo. E seguir com a luta. Isso, sim, dá um belo barulho que reverbera pelo mundo.

Portanto, por favor, criem o estado palestino! Isso vai significar que vocês abandonaram a destruição do outro para começar a própria construção. Vai significar que reconheceram o direito de Israel de existir. Vai mostrar que deixaram a ideia perfeita para edificar uma realidade, que sempre será imperfeita – como são Israel e os demais países. E vai mostrar para o mundo que, de agora em diante, vocês vão assumir o pacote inteiro: os direitos, mas também as obrigações. Será que sou eu quem está pensando numa utopia?


Fontes:

Mapa 1: http://www.passia.org/publications/bookmaps/page1.htm

Mapa 2: http://www.passia.org/palestine_facts/MAPS/1947-un-partition-plan-reso.html

Mapa 3: http://www.passia.org/palestine_facts/MAPS/wbgs_campdavid.html

6 comentários:

  1. Nao podia concordar mais com voce! Sempre pensei assim. Se Israel deixar eles criarem um estado e eles quiserem fazer isto, eles nao vao ter mais a quem culpar e terao que comecar a assumir a reponsabilidade pelos problemas normais que todo pais tem que enfrentar.

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  2. Dudu,

    agora consegui postar um comentário. Parabéns pelo blog e em especial por este artigo.

    Abração,

    Morris.

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  3. Gostei muito da sua iniciativa !!!
    Parabéns pelas matérias e principalmente por você ter dado o ponta pé inicial.

    1 grande abraço,

    PC e Mirinha //

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  4. Olá, Eduardo, passei por aqui a convite da Regina e gostei muito do conteúdo. Esse texto de Israel está muito bem colocado e repleto de verdades que, se corretamente expostas, mudariam um pouco a percepção que se tem no mundo de que o estado judeu passa por cima dos direitos humanos. Um abraço!

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  5. Nem vale a pena comentar a sua "descrição" do que aconteceu nas 3 vezes em que se propôs criar um Estado palestino. É pura desinformação e propaganda. Assim como várias mentiras.

    No entanto, isso talvez valha um pouco a pena comentar:

    "Isso vai significar que vocês abandonaram a destruição do outro para começar a própria construção."

    Não, isso significa que Israel deixou de criar assentamentos ilegais, de promover ataques mesmo quando há cessar-fogo, de destruir casas, de promover uma limpeza étnica em Jerusalém Oriental (etc, etc, etc).

    E que deixou, também de dar apoio financeiro e logístico ao Hamas, como fez nos anos 80 quando o inimigo maior de Israel era o Fatah de Arafat.

    Enfim, um artigo parcialíssimo, que pode ser de qualquer pessoa menos de um jornalista interessado na busca pelos fatos. Os palestinos são sempre os malvados, os israelenses sempre os bonzinhos. Só por isso o Estado Palestino ainda não saiu: porque os palestinos são maus e os israelenses, bons. A IDF não comete abusos, não há extremistas e supremacistas étnicos na coalização de Netanyahu, não há extremismo religioso em Israel por parte de rabinos que acreditam que os góis são por natureza inferiores e servem apenas como escravos dos judeus (frase dita pelo sr. Ovadia Yosef, um dos mais conhecidos rabinos do país e ligado à direita política do país).....e o sr. Avigdor Lieberman, que disse para quem quiser ouvir que os árabes devem ser expulsos de Israel, também não existe.

    Um texto que pode ser de um propagandista, um publicitário ou simplesmente de alguém que cresceu ouvindo contos da carochinha sionistas e idéias de supremacismo étnico desde a infância e não conseguiu se livrar de nenhuma das duas.

    Em poucas palavras: racialismo cego e desonestidade intelectual.

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  6. Exemplo da mentalidade que não deixa o Estado palestino existir:

    http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=7Sv14Kwuk-8

    Nazismo judaico no seu melhor.

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